domingo, 3 de junho de 2012

Confições de Hades




Confissões de Hades
 

Por quanto tempo andei perdido entre aqueles mesmos olhos castanhos que assombraram minha vida inteira?
Busquei-os diante dos intermináveis segundos que duraram minha vida desde então. Milhares, bilhões de segundos cujo resultado foram seis anos de uma busca infindável por olhos que nunca me veriam como alguém.
Helena ria-se com suas amigas enquanto eu a observava. Ela sorria, como sempre fazia quando não estava ao meu lado. Eu apenas a via esporadicamente por entre as vielas da universidade, mas era algo tão raro que eu jamais perdia aquele momento único, o momento de contemplar a deusa da primavera.
Ela era Perséfone e apaixonara-se pelo Adônis do curso de medicina: Helio, a pessoa que eu mais odiava nesse mundo.
No fundo, Helena me amava, mas o amor dela era por quem eu realmente era e não por aquele que ela via todos os dias. O retraído e estranho Henrique nunca será como o divertido e sagaz Matheus que eu fingia ser quando falava com ela pelo computador. Era algo impossível.
E foi criado entre o sentimento de amor por ela e nossas conversas, um ciúme doentio de mim mesmo e um ciúme ainda maior de Helio. Como ela podia amá-lo tanto e dizer que amava aquele que eu fingia ser? Como ela podia me amar, se estava tão ocupada amando a todos?
Eu passara minha vida andando em busca daqueles olhos, daqueles mesmos olhos que agora me fitavam não com amor, mas com a indiferença daqueles que parecem não perceber o quanto são queridos por alguém.
Desde minha tenra infância, quando eu a conheci na escola, eu a busquei e ela me odiou. Não havia escapatória desde cruel fado, as Fates assim decretaram e eu estava acorrentado ao meu destino, como Perséfone estava atada ao dela ao colher as flores da primavera.
Ela descobriu quem eu era e por isso me olhava assim, chamava-me de mentiroso, mas a maior mentirosa era ela. Helena não me amava? Não, ela amava Helio, aquele que tinha o carro do ano e que lhe dera um anel de diamantes. Ela amava os diamantes e não as minhas lágrimas com as quais eu lhe presenteava.
Por sorte, eu já não a conhecia mais. Ela já não era a menina que me olhou na esquina a milhões de segundos atrás, Helena era a noiva do meu colega de curso, a psicóloga se casaria com o médico errado.
Meus olhos verdes permaneciam atormentados, como ela podia?! Não! Ela não podia deixar de me amar! Ela sempre me amou, sempre, desde a primeira vez que nos vimos!!!
Era primavera e minha amada Perséfone não tinha amor nos olhos quando colheu as últimas flores do meu coração.
Agora ela me olhava com a indiferença daqueles que já não mais pertencem ao mundo. Helio devia estar procurando-a agora, em sua busca eterna pela jovem que seria afinal de contas minha esposa.
Ela sempre fora minha Perséfone e eu, seu tortuoso Hades, a fiz refém de meu reino.

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