Confissões de Hades
Por quanto tempo andei perdido
entre aqueles mesmos olhos castanhos que assombraram minha vida inteira?
Busquei-os diante dos
intermináveis segundos que duraram minha vida desde então. Milhares, bilhões de
segundos cujo resultado foram seis anos de uma busca infindável por olhos que
nunca me veriam como alguém.
Helena ria-se com suas amigas
enquanto eu a observava. Ela sorria, como sempre fazia quando não estava ao meu
lado. Eu apenas a via esporadicamente por entre as vielas da universidade, mas
era algo tão raro que eu jamais perdia aquele momento único, o momento de
contemplar a deusa da primavera.
Ela era Perséfone e apaixonara-se
pelo Adônis do curso de medicina: Helio, a pessoa que eu mais odiava nesse
mundo.
No fundo, Helena me amava, mas o
amor dela era por quem eu realmente era e não por aquele que ela via todos os
dias. O retraído e estranho Henrique nunca será como o divertido e sagaz
Matheus que eu fingia ser quando falava com ela pelo computador. Era algo
impossível.
E foi criado entre o sentimento
de amor por ela e nossas conversas, um ciúme doentio de mim mesmo e um ciúme
ainda maior de Helio. Como ela podia amá-lo tanto e dizer que amava aquele que
eu fingia ser? Como ela podia me amar, se estava tão ocupada amando a todos?
Eu passara minha vida andando em
busca daqueles olhos, daqueles mesmos olhos que agora me fitavam não com amor,
mas com a indiferença daqueles que parecem não perceber o quanto são queridos
por alguém.
Desde minha tenra infância,
quando eu a conheci na escola, eu a busquei e ela me odiou. Não havia escapatória
desde cruel fado, as Fates assim decretaram e eu estava acorrentado ao meu
destino, como Perséfone estava atada ao dela ao colher as flores da primavera.
Ela descobriu quem eu era e por isso
me olhava assim, chamava-me de mentiroso, mas a maior mentirosa era ela. Helena
não me amava? Não, ela amava Helio, aquele que tinha o carro do ano e que lhe
dera um anel de diamantes. Ela amava os diamantes e não as minhas lágrimas com
as quais eu lhe presenteava.
Por sorte, eu já não a conhecia
mais. Ela já não era a menina que me olhou na esquina a milhões de segundos
atrás, Helena era a noiva do meu colega de curso, a psicóloga se casaria com o
médico errado.
Meus olhos verdes permaneciam
atormentados, como ela podia?! Não! Ela não podia deixar de me amar! Ela sempre
me amou, sempre, desde a primeira vez que nos vimos!!!
Era primavera e minha amada
Perséfone não tinha amor nos olhos quando colheu as últimas flores do meu
coração.
Agora ela me olhava com a
indiferença daqueles que já não mais pertencem ao mundo. Helio devia estar
procurando-a agora, em sua busca eterna pela jovem que seria afinal de contas
minha esposa.
Ela sempre fora minha Perséfone e
eu, seu tortuoso Hades, a fiz refém de meu reino.
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