In Medio
Umbræ Mortis
Entre rosas e
crânios, a insólita Morte esperava seu mais ilustre convidado. Seu banquete,
serviço com pratos cadavéricos e talheres de ossos banhados a prata, contava
com os pratos mais divinos, muito mais saborosos que mel e Ambrósia. Não era um
exagero, ela esperava a principal de todas as divindades daquele tempo, o senhor
que mais moradores trouxera a seu reino: Yahveh.
No salão
principal de sua morada vítrea ela esperou, transtornada com o atraso daquele
que nunca dantes houvera em sua morada. Seu irmão jamais a havia visitado anteriormente
e talvez agora, só desejasse visita-la pelo erro que sua religião cometera. As
protegidas da Morte estavam prestes a morrer nas fogueiras da inquisição.
Deus não deveria
se atrasar, mas ele não costuma ir a lugares onde seu poder não é absoluto. Ele
abandonara a terra assim que os homens o esqueceram para viver a utopia
hedonista de amarem somente a si mesmos. No reino das sombras, seu poder jamais
seria maior do que o de Izrail, a própria Morte, por isso ele nunca se atrevera
a descer de sua cidadela.
Somente depois
que a inquisição capturara as bruxas, um convite celeste chegara. Acusaram-nas
de se deitar com o mais poderoso anjo na terra, mas o senhor dos prazeres e
desejos, jamais se deitou com uma mulher humana. Seu coração negro e lapidado
de mil formas, desejou apenas Izrail como morada, mas a morte não possui
coração ou lugar para um em sua forma enevoada.
Trajada de negro
ela cantou em sua harpa de cabelos humanos, esperando em vão à chegada daquele
por quem ela nutria o ódio mais controverso que alguém poderia sentir. Deus a
havia negado o direito de reger as tropas do céu e a lançara rumo ao abismo a
que seu amado também fora exilado. Um tartarus chamado Terra.
– Desejas esperar
mais um pouco, minha doce dama negra? O céu está rubro com teu aborrecimento,
talvez devas dormir por um ou dois milênios e assim esperar hora propicia para
o ranger de seus dentes em profusão etérea.
– Nem no mais
tardar desejo deletério, eu pararia um segundo para fechar meus olhos para o
mundo. Minhas amadas caem em desgraça, às desgraças. A religião de Yahweh
chegou ao cumulo de tentar destruir aquelas a quem preso e mil inocentes junto
a elas. Não fecharei meus olhos diante de tal coisa e se Ele não aparecer até
que minha harpa rompa, então, eu romperei os céus do vale e então será o chão
que se colorirá de rubro e castanho.
A serviçal fechou
os olhos imaginando a cena. Antes, em seu tempo, Izrail já havia deixado sua
morada. Era a guerra de Esparta com a Pérsia, a serviçal era uma das mulheres
que caminham com os homens durante as guerras para satisfazê-los, mas quando
viu a visão portentosa e divina que era a própria morte, ela aceitou-a de bom
grado, indo servir em sua morada.
– Izzabele. –
Disse Izrail fazendo um majestoso gesto na direção da jovem. – Sirva o jantar,
Nero, Heracles, Herodes e Ermitão desejam comer agora, sinto a fome dos mortos
em minha carne. Dê aos meus convidados o alimento, posto que Deus não virá ao
vale da morte, porque ele teme o mal.
– “O senhor é meu
pastor e nada me faltará e ainda que eu caminhe no vale da sombra da morte, não
temerei mal algum.” – Declamou Izzabele em deboche. – Como os homens esperam
que um deus vá salva-los de um lugar onde numa pisou? Mais espertos eram os egípcios
que adoravam Osíris, um deus que conheceu o reino dos mortos.
– E também
adoravam Rá, Isis, Neftis, Seth e muitos outros. Os homens são os animais
involutivos mais interessantes que eu conheço. Acreditam que estão sempre
evoluindo, mas ao contrario, estão apenas se tornando seres bárbaros e cruéis,
ainda pior que os animais que tanto desprezam.
– Os outros
deuses adorariam destronar esse farsante e impostor, porque vocês não fazem
nada contra Ele?
– Porque não há
arma mais poderosa do que a alma humana e sua capacidade de acreditar naquilo
que deseja acreditar. Por qual razão haveria de alguém tentar os impedir de
crer naquilo que desejam. Cristo veio e falou coisas sobre a vida e o homem e
foi este que acabou levando tudo para Deus. Não havia Deus no Cristo original e
se havia, não era Yahweh. O garoto era muito melhor do que o pai.
– Mas então não
deveriam vocês aparecer e mudar as coisas? Os homens acreditam naquilo que
vêem.
– Não seja tola
Izzabele, os homens me vêem todos os dias e me tomam como vontade divina. Eles
me verão hoje mais uma vez, pela primeira vez como uma vontade divina e eles
dirão que foi culpa deles. Não tente os entender, não estás mais com eles há
muito tempo. Os homens vêem somente aquilo que acreditam e nem sempre acreditam
naquilo que vêem.
– Não sinto falta
dos humanos.
– Pois eu sinto
falta dos anjos. Dos orbes celestiais que eu comandei um dia. Do poder que
advém de grandes feitos, mas um dia subirei aos céus de meu reino e aos céus do
reino dos humanos e chegarei a Celestia e forçarei aquele que me expulsou a me
oferecer o que me é de direito.
Sentada em seu
grande trono ossuário ela cantou a macha fúnebre com a qual foi embalada,
enquanto tocava sua harpa de longos cabelos brancos até que estes se romperam
todos. Não havia mais escolha nos céus rubros da morte, era hora de partir e
voltar a Terra para causar grande furor entre os homens.
***
– Queimem as
Bruxas! Queimem as Bruxas!
A multidão de
camponeses se mostrava irritadiça com a presença das jovens seminuas e
assustadas, queriam vê-las queimar pelo fogo santo que as purificaria, o fogo
que salvaria suas almas da corrupção imposta pelo demônio.
Esperando o
momento da primeira execução, o Cardeal Petroni olhava para seu principal
antagonista, disfarçado de camponês, com um olhar austero e desdenhoso, havia
conseguido conduzir sua igreja até esse ponto e dali iria para um futuro ainda
mais nefando e cruel.
Vê e trema
demônio, vês como tudo que eu fiz foi incitá-los contra ti? Tu não deitaste com
as ditas moças, mas elas serão queimadas como prostitutas de Satã. Petroni
provocava o camponês com seus pensamentos sórdidos e ensandecidos, sabia que o
rapaz podia ouvi-lo, afinal, o camponês era o líder dos exércitos de Lúcifer.
Samael, o demônio,
nada respondeu, apenas continuou olhando atônito a multidão que gritava sedenta
por sangue. Se aquele era o dito Povo de Deus que pregava igualdade, a paz e o
bem, onde estavam essas três premissas naquele gesto tão mesquinho e infame?
Matar jovens somente porque elas tinham poderes incompreendidos era algo mais
sinistro do que ele próprio poderia tramar.
Ao lado do
Cardeal estava o Inquisidor-Mor, Gabriel Dilce, dono de frios olhos
azul-celeste e uma face bela, porém impassível. Seu meio sorriso era de escárnio
e satisfação, as meretrizes do diabo queimariam pelo fogo da Santa Madre Igreja
pela ordem de Deus, e como ele bem sabia, pela ordem direta Dele.
– Não achas meu
senhor que é perigoso nos mantermos aqui? Logo Ela descobrirá o que tramamos e
virá imediatamente tomar partido de suas protegidas. Não é seguro permanecermos
aqui neste antro terreno. – Dirigiu-se Dilce para o Altíssimo que estava ao seu
lado.
– Acaso não tens
fé? Anjo Gabriel. Tu és um dos quatro arcanjos e eu sou o Senhor Teu Deus,
porque achas que o Anjo da Morte poderá contra nós? Mesmo que Samael reaja em
favor de sua antiga amante, é tarde demais para ambos agirem.
– Samael, assiste
a tudo com a calma maldita das águas do Estige, não creio que fará algo. Mas se
o fizer, estamos em uma nada usual desvantagem. Seriam dois dos mais poderosos
anjos contra mim, deveríamos ter trazido Miguel.
– E se Miguel
ficasse longe dos portões de Celestia, quem protegeria a morada divina? Não
Gabriel, O Arcanjo deve continuar onde está, quanto a você, bem cada um há de
ter seu tempo em seu destino. Se for destino seu morrer pelas mãos de Izrail,
então assim será e tu morreras pela Glória do Teu Senhor.
Gabriel era o
arcanjo mensageiro e como tal não possuía realmente a graça de poder sentir
medo, mas se pudesse estaria tremendo como uma palmeira em uma tempestade, ele
era o mais fraco dos sete arcanjos e Izrail era, já nos tempos imemoriais,
inferior em poder somente a Deus. Ela sozinha poderia destruí-lo com um mero
sorriso.
Ao olhar nos
olhos verdes e irresistíveis de Samael, Gabriel perdeu-se no vão momento da
Guerra Santa em que toda a harmonia se perdera. No momento em que Izrail sucumbiu aos
braços daquele que ela deveria destruir e por isso a general do exercito
celeste desvirtuara-se.
Após a Queda, com
o sacrifício de Lúcifer, no paraíso. Samael se tornara o regente do abismo e o
principal antagonista do Senhor. Em Inferna ele tramava sua vingança há
milênios.
Mas Izrail,
a leal, poderosa e imprevisível Izrail. Expulsa do Alto Reino por ter se apaixonado,
permanecera impassível diante de todos os fatos, sem aliar-se a um ou a outro
lado. Não possuía de fato um ódio tão poderoso por Deus que a fizesse se voltar
contra ele, mas seu amor recluso por Samael a impedia de aliar-se as forças
celestes, por todos os milênios que se seguiram até então. A regente do
submundo nunca tivera um motivo para escolher entre Inferna ou Celestia, até
agora.
– Queimem as
Bruxas, Queimem as Bruxas! – A multidão gritava cada vez mais alto,
transportando o Inquisidor-Mor de volta a suas principais funções no momento,
como Arcanjo regente da terra, e atual inquisidor-mor do Santo Oficio, ele era
encarregado de prosseguir com o show de horrores.
– Vós, sob o nome
sagrado do Senhor, confessais que dormites com o demônio durante o Sabbath?
– Sim, nos
confessamos. – As acusadas de bruxaria choravam enquanto eram arrastadas para
mais perto do júri e mais cedo ou mais tarde, da fogueira, mas já não havia
escolha, foram torturadas até um ponto em que a morte se tornara mais suportável
que o tormento. Talvez elas fossem para uma terra onde a magia e a paz fossem
eternas, um lugar de descanso e aprendizado.
– Confessais que
seduzistes os homens da vila para que estes participassem de suas orgias com
Satã? E que praticastes relações carnais com as bestas da floresta?
– Sim nós
confessamos. – Já fracas de tanto chorar e de tantos maus tratos, as vozes
saíram sem animo ou vontade, já se sentiam mortas, não importava mais a dor.
– Então que Deus
tenha piedade das suas almas. – Gritou o Cardeal Petroni, rindo-se da piada
presente na frase.
– Não, por favor.
Por favor. – As mais jovens gritavam amedrontadas, com o fôlego retomado pela
eminência da dolorosa morte no fogo, mas as mais velhas apenas eram arrastadas
como bonecas de pano para o tronco onde seriam amarradas e queimadas.
A multidão
gritava extasiada aumentando o coro estridente quando o fogo ergueu-se
inexorável sobre as mulheres que também gritavam, mas de dor, desespero e
tristeza, logo os gritos das vitimas e da multidão se uniram numa espécie de
ritual macabro tão portentoso que poucos perceberam a estranha escuridão
gradativa dos céus e a nevoa fria e densa que se fazia sobre os seus pés.
Samael com seus
olhos flamejantes foi o primeiro a ver a opulenta figura, ainda mais portentosa
que todos os ritos, mais inexorável que o fogo e ainda mais fria que os
próprios olhos do Arcanjo Terreno, Izrail sorria ao invadir a terra com seu
séqüito de mortos.
Logo a multidão
voltou-se para a criatura trajada de nevoa, suas roupas pareciam se desfazer ao
vento assim como seus cabelos, aquela mulher fantasmagórica e os seus convivas
só poderiam ser monstros sobrenaturais que as bruxas invocaram para assustar a
todos ali presentes.
Gabriel fitou
Izrail com um esgar que transpassou seus olhos frios e sua natureza angelical,
o antigo líder dos exércitos de Deus, agora se tornara algo maior e mais livre
do que todos os anjos que já comandou. Talvez até mesmo capaz de enfrentar
Yaveh, ali tão longe de Celestia.
Petroni, porém
não se assustou com a figura e continuou com seu olhar de desdém e arrogância,
não seria um anjo expulso e um bando de fantasmas que faria frente a Deus e seu
fiel Guerreiro.
– Yahweh Yehovah,
como causastes tanto furor entre os homens contra aquelas que estavam sob minha
proteção? Porque te viraste contra mim e contra aqueles que mesmo na escuridão
ainda lhe tinham em graças. – A voz gélida e metálica do anjo da morte encheu
toda a vila de medo e temor diante da regente do vale das sombras, cujo mal
eles sempre temiam, apesar da oração.
– Como ousas
falar desta forma diante do seu Senhor? Esqueces de quem eu sou? Não te
esqueças Izrail que eu a criei das sombras e para as sombras retornaras.
– Tu não me
criaste e sabes bem disto. Como não criastes Lúcifer ou a ti mesmo. Eu sou
filha da Origem e do Caos e tu não podes me desfazer em trevas, posto que eu
seja a treva de todo o mundo.
A nevoa ficava
cada vez mais densa ao passo que os céus escureceram em uma tempestade inerte,
mas perigosa. Logo os céus se romperiam em ferro fogo, ódio e lágrimas em nome
de Izrail.
O véu negro da
morte estendeu-se por todo o chão e tocou o fogo que consumia as jovens, este
se tornou azul como gelo e as almas “Purificadas” saíram do fogo em direção
àquela que as protegia.
– Então Izrail,
Malak al-Maut, se vieste apenas levar suas protegidas a teu reino, então parta
daqui imediatamente. – Gabriel falava escondendo o temor que tinha frente a
aquela que o comandou um dia.
– Calai-vos
Gabriel, Anjo da Vida, eu não me ergui de meus domínios apenas para ver a cara
pútrida de vós. Vim para mostrar o quanto estou aborrecida com o ato de seu
Senhor e mostrar-lhe que escolhi um lado, o meu lado.
As chamas azuis
aumentaram de intensidade à medida que as sombras as alimentavam, as fitas das
roupas de Izrail também se incendiaram e com toda sua cólera, seu corpo, suas
roupas e seus súditos incineraram todo o chão e céus. Tornando a cidade e seus
habitantes uma capital do inferno, feita de fogo, lágrimas e gritos.
Os olhos do anjo
encheram-se de ódio e furor, em frente aquela terrível criatura que se erguia
diante de Deus e os desafiava destruindo a cidade em que começaram o grande
plano divino da Inquisição.
O fogo consumia
todo animal, mulher, criança ou homem. Todas as coisas tornavam-se cinzas,
menos as almas, e os quatro imortais que se encaravam prestes a travar uma nova
batalha que mudaria o destino de toda a humanidade.
Samael
divertia-se apenas calado e assistindo a batalha mental que se desenrolava
entre seu inimigo e sua antiga amante, como Izrail havia se tornado ainda mais
bela e poderosa do que fora outrora? Era uma pergunta sem resposta em meio aos
tantos outros mistérios daquela deusa em forma de mulher.
– Eu a dominarei
e a destruirei, amante de Satã. – Por fim, Gabriel abandonou suas vestes
eclesiásticas e retornou a sua forma angelical, com seu corpo alto e esguio,
protegido pela tradicional armadura prateada com os símbolos em ouro e bronze
de Celestia e dos Arcanjos.
O Anjo da Morte
apenas estudou os entalhes na longa espada com entalhes azuis elétricos na mão
de seu opositor, não pretendia mata-lo, mas sabia que não teria outra escolha
se ele resolvesse ataca-la de uma maneira enérgica.
Gabriel não
perdeu tempo, não podia dar-se ao luxo de brincar com o próprio anjo da morte e
atacou Izrail com sua graça e táticas obtidas após eras e milênios de batalhas
sangrentas pelo Reino dos Céus.
A primeira
estocada do arcanjo foi facilmente detida pela espada negra de Izrail, apesar
daquela não ser sua tradicional e lendária espada, ainda servia para uma luta
justa em que inevitavelmente ela seria a vencedora. Mas por seu devaneio ser
acertada pelo segundo golpe foi inevitável.
Ferida, a fúria
de Izrail cresceu. Com sua espada atacou o flanco de Gabriel pela direita e
depois furou onde deveria ser o coração. Caído o anjo a olhou com a fúria de
mil anjos, lançando-a com seu poder em direção ao poste em chamas.
O fogo
levantou-se e se arrastou como uma serpente em volta do arcanjo que gritava de
dor e raiva, enquanto Deus apenas assistia a cena sem tomar partido.
– Senhor, porque
me abandonaste? – Gabriel gritava já cansado e tomado pelo poder subjugador de
Izrail.
– Porque é isso
que ele costuma fazer pelos que se sacrificam por ele. Felizmente para você
Gabriel, nós nos veremos de novo. – Com um aceno de mão, a serpente se
dissipou, libertando o atônito anjo. – O mesmo digo de você, Samael, houve o
tempo em que você fora o mais corajoso dos anjos, mas agora não passa de um
covarde tão grande quanto Yahweh.
O demônio olhava
para sua amante com a raiva comedida dos namorados, como ela poderia dizer algo
assim dele?
– Ouçam o
crepitar das chamas enquanto ela consome a cidade onde tudo começou, aqui será
o Gênesis de uma nova batalha e o fim dela será o fim de um ou de todos nós.
Escute, Yahweh, eu escolho o meu lado e você e Samael me verão no final dos
tempos para a última Jihad
– Ouça Izrail,
você não poderá contra mim. – Disse, por fim, Yahweh e sua voz encheu os céus e
todos os universos.
– Então eu
morrerei tentando e te arrastarei comigo ao mais baixo dos infernos.
Uma ventania
avassalou a nevoa, as nuvens do céu e o fogo, extinguindo-os e levando Deus e
seu guarda-costas. Restava apenas poeira, as trezentas almas da vila, a Morte e
o Diabo, que logo se foi também deixando sua ex-amante e nova inimiga.
Izrail sorriu em
meio à poeira e as cinzas daquela vila, acompanhada pelas quatro bruxas. Todas
as cinco estavam livres da opressão divina, livres de todo o mal causado pela
briga de poder entre Yahweh e seu opositor.
Um jovem de vinte
anos tocou o mando da senhora dos mortos, queria saber o que seriam das pobres
almas que foram incineradas pelas chamas azuis que cobriram toda a vila.
– Noli me
tangere. – Não me toque. – Vocês gritaram pelo furor dos céus e a fúria de Deus
para que as almas das bruxas fossem purificadas. Bem, então porque não gritam
mais um pouco? Porque no meu reino, vós não entrareis.
Lágrimas e
lamurias encheram a nevoa enquanto as almas que subiram do submundo desciam
novamente com sua rainha. O sangue, o ferro, o fogo e as lágrimas haviam tomado
a pequena vila e agora, os camponeses em vão gritavam a velha ladainha que
aprenderam.
– Senhor, porque
nos abandonaste?
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